O mineiro Carlos Drummond de
Andrade é considerado por muitos, o poeta brasileiro mais prestigiado do século
passado. Ele representou a segunda fase do modernismo
brasileiro (1930-1945). O poeta de Minas Gerais produziu vários poemas,
destaque para: Poema Quadrilha, Poema de sete faces, Poema as sem-razões do
amor, Poema verbo ser, Poema da necessidade, Poema no meio do caminho, Poema
José, dentre outros. A utilização da linguagem popular e os cenários cotidianos
marcaram a obra “José”. Além disso, as manifestações do movimento modernista
como verso livre e ausência de um padrão métrico nos versos do poema “José”
foram recorrentes.
José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
Carlos Drummond de Andrade
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