segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Quem puxa-saco puxa tudo, inclusive tapete

 

Eu amo o chefe, o diretor, o prefeito, o vice-prefeito, o vereador, o deputado, o governador, o senador, o ministro, o presidente, o secretário, o médico, o delegado, o empresário, o padre, o pastor. Eu gosto das pessoas poderosas. Eu sou solícito e sorridente. Eu ofereço tudo que tem, até o copo de água. Eu quero sair bem na foto, literalmente – no facebook, no instagram, no twitter, no zap, na tevê, no jornal, no rádio, na revista, nos eventos sociais, nas reuniões, nas campanhas eleitorais, nas festas, nas inaugurações de obras públicas. O meu intuito é tratar bem o superior enquanto for superior e obter algo para meu próprio benefício. Afinal de contas, quem sou eu?  Eu sou a figura humana detestável que adora lisonjear servilmente, bajular. Sou conhecido popularmente como: (puxa-saco, bajulador, lambe-botas, babão, adulador, baba-ovo, capacho). Faço tudo para agradar ao chefe, tenho personalidade dissimulada e sou naturalmente interesseiro. Além disso, passo por cima de valores morais, atropelo quem quer que esteja no meio desse caminho. Caro leitor, você convive ou já conviveu com um bajulador no seu trabalho? O puxa-saco de plantão está presente em todas as empresas. De norte a sul do Brasil, por ação do adulador, muitos trabalhadores são perseguidos na administração pública e privada. Infelizmente, são “julgados” e “condenados” sem direito a defesa. Vários são exonerados e demitidos, sendo que a maioria não tem oportunidade para expor sua versão a respeito dos acontecimentos. Os capachos têm como ideal adular o superior. Alguns tornam-se autoridades e recebem boa remuneração. Outros são apelativos com suas bajulações sem limite, deixam seus empregadores em situações constrangedoras ou comprometedoras. O desejo ardente de ganhar a admiração do patrão, causa prejuízo no ambiente de trabalho, com outros funcionários. Os puxa-sacos não serão extintos da terra. Infelizmente, o bajulador do presente poderá ser o patrão do futuro. O mais viável é ficar em silêncio e fazer o trabalho de maneira correta. Enfim, conforme José Gomes Filho, o famoso Jackson do Pandeiro (cantor, compositor e multi-instrumentista brasileiro): “A gente trabalha tanto e não consegue o que quer. Quem anda puxando o saco está comendo de colher.”

Sérgio Lopes, Jornalista, professor, especialista em TV, Cinema e Mídias Digitais e em Letras (Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Inglesa)


domingo, 23 de outubro de 2022

Cai Água, Cai Barraco


A Banda Biquini Cavadão foi formada no ano de 1985, no Rio de Janeiro. Tiveram papel relevante no cenário musical dos anos 80 (século passado).  Produziram canções marcantes na música brasileira como: Timidez, Vento Ventania, Zé Ninguém, Tédio, Impossível, Múmias dentre outras. Há 37 anos na estrada, percorreu todo o país... Em abril de 2022, Biquini oficializa exclusão do 'Cavadão' do nome da banda.  Agora, é Banda Biquini...  O quarteto carioca também produziu canções que não são tão conhecidas do grande público, o destaque abaixo é a letra “Cai água, Cai Barraco”, lançada no ano de 1991.  No verão carioca, as chuvas são intensas e os menos favorecidos economicamente sofrem com a questão do saneamento básico. O esgoto fica a céu aberto, o lixo não tem destino adequado, a água não é de qualidade. Infelizmente é “um desastre ecológico de grandes proporções”.  Ademais, as moradias são precárias. Muitos moradores não têm oportunidade de trabalho, a educação é ruim, o tráfico de drogas é dominante e a polícia está sempre atuando nos barracos. A população está cansada de sofrer...  Enfim, uma triste realidade de 1991, ainda é atual em muitas habitações sofríveis de grandes regiões metropolitanas do Brasil.  

Sérgio Lopes, Jornalista, professor, especialista em TV, Cinema e Mídias Digitais e em Letras (Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Inglesa)

                                                Cai Água, Cai Barraco (Biquini)


Cai Água, Cai Barraco (Biquini)

Cai água, cai barraco

Desenterra todo mundo

Cai água, cai montanha, enterra quem morreu

É sempre assim todo verão

O tempo fecha, inunda tudo

É sempre assim todo verão

Um dia acaba o mundo todo

Derruba o muro, o prédio podre, a casa velha

Empurra a velha

Pega a bolsa, sai batido

(E sobe o morro, sobe o pau, sobe o diabo)

Desce o pau em toda gente, a gente temo' que corrê

(Corre pra cima e pra baixo, se enfia num buraco)

Manda fogo na polícia, pr'esses caras aprendê

(E sobe o morro, sobe o pau, sobe o diabo)

E desce o pau em toda gente, a gente temo' que corrê)

(Corre pra cima e pra baixo, se enfia num buraco)

E manda fogo, "pr'esses caras aprendê

Tem mais um filho na barriga

Outra criança pra mamar

Vai ser criado pela rua, vai ter muito que ralar

O povo anda armado

O povo anda armando

O povo todo anda armado e está cansado de sofrer

(E sobe o morro, sobe o pau, sobe o diabo)

Desce o pau em toda gente, a gente temo' que corrê

(Corre pra cima e pra baixo, se enfia num buraco)

Manda fogo na polícia, pr'esses caras aprendê

(E sobe o morro, sobe o pau, sobe o diabo)

E Desce o pau em toda gente, a gente temo' que corrê

(Corre pra cima e pra baixo, se enfia num buraco)

E manda fogo, manda fogo Coelho

Bate no filho, bate-boca, bateria

Bate palma e não para debater

Bate no filho, bate-boca, bateria

Bate uma e não para de bater

Bate no filho, bate-boca, bateria

Bate bola e não para debater

Bate no filho, bate-boca, bateria

Bate perna e não para de bater

(E sobe o morro, sobe o pau, sobe o diabo)

Desce o pau em toda gente, a gente temo' que corrê

(Corre pra cima e pra baixo, se enfia num buraco)

E manda fogo na polícia, pr'esses caras aprendê

(E sobe o morro, sobe o pau, sobe o diabo)

Desce o pau em toda gente, a gente temo' que corrê

(Corre pra cima e pra baixo, se enfia num buraco)

E manda fogo na polícia, pr'esses caras aprendê

Compositores: Andre Fernandes Leite Da Luz, Carlos Augusto Pereira Coelho, Alvaro Prieto Lopes, Miguel Flores Da Cunha, Bruno Castro Gouveia

 


sexta-feira, 21 de outubro de 2022

José

O mineiro Carlos Drummond de Andrade é considerado por muitos, o poeta brasileiro mais prestigiado do século passado. Ele representou a segunda fase do modernismo brasileiro (1930-1945). O poeta de Minas Gerais produziu vários poemas, destaque para: Poema Quadrilha, Poema de sete faces, Poema as sem-razões do amor, Poema verbo ser, Poema da necessidade, Poema no meio do caminho, Poema José, dentre outros. A utilização da linguagem popular e os cenários cotidianos marcaram a obra “José”. Além disso, as manifestações do movimento modernista como verso livre e ausência de um padrão métrico nos versos do poema “José” foram recorrentes.

José

E agora, José?

A festa acabou,

a luz apagou,

o povo sumiu,

a noite esfriou,

e agora, José?

e agora, você?

você que é sem nome,

que zomba dos outros,

você que faz versos,

que ama, protesta?

e agora, José?

 

Está sem mulher,

está sem discurso,

está sem carinho,

já não pode beber,

já não pode fumar,

cuspir já não pode,

a noite esfriou,

o dia não veio,

o bonde não veio,

o riso não veio,

não veio a utopia

e tudo acabou

e tudo fugiu

e tudo mofou,

e agora, José?

 

E agora, José?

Sua doce palavra,

seu instante de febre,

sua gula e jejum,

sua biblioteca,

sua lavra de ouro,

seu terno de vidro,

sua incoerência,

seu ódio — e agora?

 

Com a chave na mão

quer abrir a porta,

não existe porta;

quer morrer no mar,

mas o mar secou;

quer ir para Minas,

Minas não há mais.

José, e agora?

 

Se você gritasse,

se você gemesse,

se você tocasse

a valsa vienense,

se você dormisse,

se você cansasse,

se você morresse...

Mas você não morre,

você é duro, José!

 

Sozinho no escuro

qual bicho-do-mato,

sem teogonia,

sem parede nua

para se encostar,

sem cavalo preto

que fuja a galope,

você marcha, José!

José, para onde? 

Carlos Drummond de Andrade